quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Para a Carla de Elsinore

"(...) Seja por essa razão, ou porque tenho simplesmente os neurónios deteriorados, a verdade é que a minha memória é catastrófica, ao ponto dos meus esquecimentos me chegarem a assustar. Livros lidos, pessoas e situações que conheci, filmes vistos, dados que um dia aprendi, tudo se confunde e enreda aqui dentro. De facto, quando decorre algum tempo, vinte anos suponhamos, sobre alguma coisa de que me lembro, às vezes é-me difícil distinguir se o vivi, o sonhei, o imaginei, ou, quem sabe, o escrevi (o que demonstra por outro lado, a força da fantasia: a vida imaginária também é vida).(...)"
do livro "A louca da casa" de
Rosa Montero
Vozes do Mundo - Editora
(pp. 140)

Bem sei que não parece!
Mas não imaginam a vontade que tenho de passar longos momentos sozinha.
Aliás... Cada vez preciso de mais tempo sozinha!
Talvez para contrabalançar o falar tanto quando estou acompanhada.
Mas a verdade é que cada vez mais preciso de espaço, de tempo, de solidão.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

A desvantagem de se estar sozinha sempre que se quer,
é que,
também se está sozinha quando não se quer.

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Rodopio. Rodopio. Rodopio. Rodopio.
E caio no fio negro
do vazio.
Rodopio. Rodopio.
Até já nada ver para além do fio negro do meio.

Sinto um frio de rachar.
Sinto-me nua.


Sinto um frio de rachar porque não tenho nada a proteger-me. Sinto-me sozinha, sem vontade de falar, nem de estar, nem de ouvir. E por isso, sinto-me nua e fria. Não ouço as tuas mãos junto ao meu pescoço. Não me pegaste pela mão para me levar. Não vieste. Não chegaste. Nem sequer foste. E por isso sinto-me fria. Um frio dentro e fora. Um frio que envolve a minha nudez emocional.

domingo, 21 de janeiro de 2007

MY WAY

And now, the end is here
And so I face the final curtain
My friend, I'll say it clear
I'll state my case, of which I'm certain
I've lived a life that's full
I traveled each and ev'ry highway
And more, much more than this, I did it my way
Regrets, I've had a few
But then again, too few to mention
I did what I had to do and saw it through without exemption
I planned each charted course, each careful step along the byway
And more, much more than this, I did it my way
Yes, there were times, I'm sure you knew
When I bit off more than I could chew
But through it all, when there was doubt
I ate it up and spit it out
I faced it all and I stood tall and did it my way
I've loved, I've laughed and cried
I've had my fill, my share of losing
And now, as tears subside, I find it all so amusing
To think I did all that
And may I say, not in a shy way,"Oh, no, oh, no, not me, I did it my way"
For what is a man, what has he got?
If not himself, then he has naught
To say the things he truly feels and not the words of one who kneels
The record shows I took the blows and did it my way!
Yes, it was my way

Quem prende quem?


Às vezes, sinto-me de tal forma a flutuar
que é quase como se não pertencesse a lugar nenhum
nem a ninguém.
E não confundir com liberdade,
porque trata-se apenas de solidão.

"A louca da casa"

Ao longo de um dia, passam-nos vários pensamentos pela cabeça. Passado. Presente. Futuro. Lembramo-nos de coisas que nos disseram. Cenas de filmes que vimos. Passagens de livros. Ou simplesmente coisas que vemos. Tudo isto se mistura até criar uma cor ocre que preenche os vazios da nossa mente. Ou, como dizia Santa Teresa de Jesus, da nossa louca da casa: a imaginação.

Hoje houve três pensamentos que me vieram várias vezes à cabeça.

A inevitabilidade do acaso. Um sobre a C. que me disse que ainda bem que me tinha apresentado a E., porque sabia que eu lhe estava a dar, o que ela própria não conseguia. E estão aqui dois aspectos implícitos que considero tornarem a existência mais doce: a humildade de reconhecer as limitações e a forma como entramos na vida das outras pessoas quando elas/nós precisam/os. Todos nós nos cruzamos. Reparamos nuns e noutros não. Falamos hoje e amanhã já não nos identificamos. E existem aqueles que uma vez fazendo parte das nossas vidas, não podem voltar a partir.

Um galo no galinheiro. Certo dia, um amigo disse-me para ir almoçar com ele, porque gostava de entrar no restaurante e sentir que todos os homens o invejavam por ele estar com uma mulher atraente. Fez-me pensar em como os homens são como os galos e gostam de se sentir no centro do galinheiro. Podem namorar com uma mulher discreta, mas alguns não gostam de perder a oportunidade de incharem o papo com o olhar dos outros, enm que seja com uma amiga. Quase como se existisse no básico uma vontade dos homens se sentirem com um "pénis" maior do que o de todos os outros.

Dietas, o meu problema. Há formas de se dizer determinadas coisas. E existem pessoas que colocam charme sempre que falam. A propósito da minha dieta, um homem disse que eu não era gorda. Era um tipo físico grande, como o eram as típicas divas italianas. Achei imensa piada, porque isto é saber comunicar e encontrar os pontos positivos, naquilo que para a maioria poderão ser defeitos. Haja mais charme na comunicação e as pessoas serão mais felizes. Quer as que falam com charme, quer as que recebem o seu efeito.

Estas foram algumas das ideias que tomaram conta da louca da casa.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

A escrita serve para:
embelezar o que vejo,
descrever o que sinto,
organizar a alma.

terça-feira, 16 de janeiro de 2007

Entrelaçados

Conheço poucas imagens tão sublimes quanto dois corpos entrelaçados. Um pé que se enrosca noutro pé. Um braço que passa por cima do corpo e nos abraça enquanto adormecemos. Um movimento para o corpo se ajustar ao outro corpo.

Como disse, conheço poucas imagens tão sublimes quanto dois corpos entrelaçados a dormirem. A repiração que se ajusta, como se a natureza fosse feita para que dois corpos acabassem sempre juntos. O batimento cardíaco que desacelera.

E enquanto dormem encontram-se. Falam linguagens que não conhecemos, que não dominamos enquanto estamos acordados. Como se terminasse uma dança e começasse outra, quando adormecemos entrelaçados. Como se dormir entrelalaçado em alguém fosse um quarto de comunicação com a outra pessoa. Como se dormir entrelaçado pertencesse a um quadro renascentista com as peles em dourados e cores quentes.

Conheço poucas sensação tão sublimes quanto dormir entrelaçada em alguém quando o meu corpo se entende com o outro corpo. Quando a minha respiração se funde na outra e a certa altura já não me sinto. Apenas nos sinto: a ambos em sintonia.

Abortar. Viver. Morrer.

No fim de semana estava a jantar com os meus pais, enquanto víamos o telejornal. De entre os vários assuntos acabamos uma vez mais a falar sobre o referendo do aborto.

Os meus pais enquanto religiosos convictos são contra. Dizem que a consciência deles não ficaria descansada se fossem a favor da morte. Influenciados pelo discurso religioso que ser a favor do aborto é ser a favor da pena de morte. Tentei que a discussão abandonasse a tonalidade moral e se colorisse de aspectos mais práticos.

O aborto existe. Quer seja legal ou não fazê-lo. Vai sempre existir. O enfoque deveria ser colocado noutras tonalidades. A questão da saúde pública. A questão da falta de informação/ formação. A questão das condições psicológicas para se ser mãe. A questão da vida dessas crianças que não são desejadas.

Sou a favor de que seja despenalizado o aborto. Sinto-me influenciada pela crescente, e quiçá exagerada, preocupação com o bem estar das pessoas, quando me posiciono assim. Mas a verdade é que a ciência tem vindo a desenvolver-se para melhorar a nossa qualidade de vida, ou não? As espécies têm vindo a evoluir. Quem sabe esta não é também uma forma de evolução? Ou talvez estejamos enganados, e enquanto animais devemos procriar sempre, independentemente de todos os outros factores envolvidos? Ou então podemos ainda ser mais demagógicos e discutir o que se considera um ser humano.

Como tento ser pragmática, sou a favor. Sou a favor com responsabilização. Sou a favor da responsabilização de cada MULHER para que esta se lembre que em conjugação com um HOMEM tem o poder de gerar VIDA. E sou a favor de os HOMENS sejam capazes de procriar em consciência, já que somos dotados desta característica que nos distingue dos animais, que é o complicado campo emocional.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

Tenho mesmo de pensar antes de falar.
Pensar se não estarei a fazer comentários sobre os outros que se tornam
autênticas verdades sobre mim.

Nem sempre fazemos o que planeamos.

Por vezes temos de alterar tudo o que tínhamos planeado para o fim de semana. Acontece. Não é premeditado. Umas vezes, por bons motivos e, outras vezes nem tanto. Contudo alteramos. E depois até nos esquecemos do que tínhamos pensado antes da alteração. Deixamo-nos ir na corrente de acontecimentos para viver o que vai surgindo perante os nossos olhos. E quando chegamos ao fim felizes com isso, percebemos que ainda bem que estamos abertos às mudanças de planos, porque nem sempre sabemos o que é melhor para nós.

Início de temporada

Estou obviamente a falar da temporada cinematográfica. Por acaso, não é assim tão óbvio, mas já tinha escrito a palavra e não me apeteceu apagar. Acontece-me isso às vezes. Escrevo determinado texto por ter saído uma palavra ao acaso ou fruto de um engano. Agora já ficam a saber de onde vêm determinadas coisas.

Voltando ao início: este ano fui três vezes ao cinema. Fui ver "A ciência dos sonhos", "O amor não tira férias" e o "Apocalypto". E escrevo apenas para dizer que tenho pouco para dizer dos filmes. O que quer dizer que eles cumpriram poucos dos critérios com que avalio os filmes (veja 1º post sobre Dias de Tela). E quando é assim, alguns podem cumprir a sua função lúdica. "O amor não tira férias" cumpre esse critério. Faz-nos rir. Faz-nos querer que o Jude Law nos bata à porta bêbado! Nos outros dois podem encontrar-se uma ou outra coisa interessante, mas em comum têm a mensagem de que nós vemos o que queremos e corremos na vida em função do quanto acreditamos nisso. Como poderão imaginar, cada qual à sua maneira.

quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

Prometo voltar logo que a intoxicação alimentar me permita e se não tiver mais enfermidades...
Uma vez que desde o final do ano já tive uma gripe e uma infecção de garganta!

domingo, 7 de janeiro de 2007

Às vezes gostaria de compreender melhor,
porque é que o meu espelho não me devolve a imagem
que os outros vêem quando olham para mim.

que animação!

Ontem uma rapariga olhou para mim e, com um sorriso verdadeiramente autêntico disse-me: "Que bom encontrar-te! É que estar contigo anima a minha existência!"

E eu Ri! E pensei: "Ouvir estas coisas também animam a minha existência!", mas não lhe disse. Estou ansiosa por voltar a vê-la para lhe dizer isto exactamente. E não tinha interesse sexual, porque eu perguntei-lhe.

Digam sempre tudo o que pensarem dos outros, porque podem animar a existência de alguém. Não se privem de dar elogios...

Let's dance

Let's dance put on your red shoes and dance the blues
Let's dance to the song
they're playin' on the radio
Let's sway
while color lights up your face
Let's sway
sway through the crowd to an empty space
If you say run, I'll run with you
If you say hide, we'll hide
Because my love for you
Would break my heart in two
If you should fall
Into my arms
And tremble like a flower
Let's dance for fear
your grace should fall
Let's dance for fear tonight is all
Let's sway you could look into my eyes
Let's sway under the moonlight,
this serious moonlight
If you say run, I'll run with you
If you say hide, we'll hide
Because my love for you
Would break my heart in two
If you should fall
Into my arms
And tremble like a flower
Let's dance put on your red shoes
and dance the blues
Let's dance to the song
they're playin' on the radio
Let's sway you could look into my eyes
Let's sway under the moonlight,
this serious moonlight
David Bowie - Let's dance

sábado, 6 de janeiro de 2007

Tento só DAR aos outros aquilo que sou capaz de NÃO cobrar.

As outras flores que habitam em minha casa: Narciso e Maria Papoiola


Lonely Can be Sweet

"Please come sit down
I need to set you straight
Before we go any further
I've learned from loneliness
That lonely can be better and lonely can be sweet
Sure, I dont need a man to be complete
And I also know that what I want and what I need don't always
meet
But being alone ain't all that bad
"Cause see I've been there and I've done that
I'm in the midst an evolution to myself
I was tired of the search
So I had to sit it on the shelf
Lonely can be sweet
I hab been looking for my comboy
Like that girl says in that song
"Where have all comboys gone?"
In my former life
My once comboys have gone hoochie hopping and car shopping
Riding their egos like wild horses
On collision courses with their machismo
While I slow slaughtered
As their valor and virtue drowned in deep water (deep water)
So, I decided to chill with me for the moment
And play my own violins
Strike me own candlelights
So every night is my night
Are You listening?
I need to be completely sure that You are listening
I used to think that the moon's name might as well have been
Lonely
Now I sip my night full
Like I were blackberry marsala
Then lick the excess of my lips
So as not to waste one drop of it sweetness
I sastisfy my wonderlust with with the wildness of the night
And the comfort of my self
I've taken up hedonism as hobby
And made it harder for the next man
To step into my life without plan
For how to please me better then I please myself
So If You've come without a plan
Then make a swift retreat 'cause
Lonely can be Sweet"
Ursula Rucker - "Silver or Lead"

Existem poucas coisas tão boas, quanto acordar num sábado de sol, com os gatos a fazerem "romrom". Acordar cedo para ver o dia passar depois de uma noite de sonhos em Inglês. Sentir o vento frio da manhã. Comprar o jornal e sentar-me no meio de livros a tomar o pequeno almoço. Andar de carro, nas ruas quase desertas a ouvir CSS - Cansei de ser sexy-. Existem poucas coisas tão boas, quanto estar descansada em casa a ouvir David Mathews Band, enquanto faço sopa de legumes.

Na verdade, existem poucas coisas tão boas quanto estar bem só.

Tão bom quanto estar bem só, é estar-se bem acompanhado.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

"O meu Amor tem..."

É importante deixar ir. Deixar ir o nosso Amor. Ele sabe voltar. Voltará se assim quiser. É importante deixá-lo livre de nos amar ou não amar. Aceitar isso. Isso que nos deixa, por vezes, infelizes, porque não acontece exactamente como queríamos.

É importante olhar para o Amor de frente e dizer-lhe: "És livre de não me amar. És livre de não me amar sempre. És livre de voltar e, voltar a amar-me. Essencialmente és livre."

É importante aprendermos a viver sem o ansiedade que o Amor se vá sem que nos diga adeus. É também importante acreditar. Acreditar que se o Amor não ficar... Não é por sermos maus, ou não merecermos. Às vezes, é apenas porque não seria o melhor para aquelas duas pessoas estarem juntas, ou então, porque o Amor não está preparado para acontecer ali, naquele momento.

É importante vivermos perto do Amor, sem medo de o perder, sem medo que ele seja LIVRE.

terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Enquanto estive doente, parte das minhas horas foram passadas a ver filmes. Decidi ver aqueles filmes que alguém me falara e que nunca tinha visto.

Antes de avançar e expor aqui os filmes que vi, decidi fazer uma pequena análise. É interessante pensar no que me faz gostar de um filme. Nem sei bem se algum dia me dei a esse trabalho. De uma forma sistemática não. Talvez no meio de conversas já tenha referido alguns dos motivos.

Então vejamos:
1. A fotografia do filme;
2. A banda sonora;
3. O enredo;
4. Mostrar culturas, sociedades ou épocas diferentes da minha;
5. A forma que o filme tem;
6. (O mais importante.) Ficar a pensar em alguma coisa no fim do filme;

Sendo assim, o que são para mim filmes inesquecíveis são os que fiquei a pensar na vida que me rodeia em geral e na minha própria vida. E por isso, o que hoje é um filme que gosto muito, amanhã pode não o ser e, obviamente vice-versa.

Depois desta pequena introdução, passo a mostrar quais os filmes que acompanharam os meus dias:

Alta Fidelidade

Uma mistura do papel da música nas nossas vidas misturado com uma análise sobre o comprometimento emocional aos 30 anos. O revisitar das relações do passado para perceber a relação actual. O revisitar para compreender o que se quer para o futuro. A análise do entusiamo em conhecer alguém pela oposição do medo de se manter a construção de uma relação já conhecida. E o papel da música. O papel da música fez-me lembrar a coletânea que fiz para oferecer ao meu amor, com todas as letras a dizerem-lhe o que eu nem sempre sou capaz de lhe dizer... Quem nunca fez isto? Quem nunca teve medo de se comprometer, por achar que poderia conhecer uma pessoa com quem se entendesse melhor, de quem gostasse ainda mais e se sentisse mais completo?

Water

Um filme lindo sobre as viúvas na Índia dos anos 30. Um filme sobre a anulação do papel pessoa em prol de um papel aparentemente menor, o de mulher. A submissão aos costumes de uma religião que por vezes só serve os interesses pessoais. E fez-me lembrar quantas atrocidades não se comentem mascaradas de interesses superiores e aparentemente grandiosos.

A domadora de baleias

Quem nunca quis desesperadamente agradar a alguém sem o conseguir? Quem nunca chorou por se sentir pouco capaz? Quem nunca pensou usar poderes mágicos para mudar alguma coisa?

Os Maoris. As lendas. Um povo. As baleias.

Romance e cigarros

É um musical interessante, divertido e profundo. Mostra um pouco a realidade da amante, da mulher atraiçoada e de como o homem decide quando se confronta com a escolha. E como diz uma minha amiga "alguns filmes baseiam-se em realidade, portanto o que lá acontece é provável que se repita na vida comum".

Magnólia

É um filme com uma carga emocional fortíssima. O confronto com a morte e com tudo o que as pessoas querem fazer quando a sentem por perto. É uma história de expiação dos erros do passado, num presente que se cruza com todos os personagens.

segunda-feira, 1 de janeiro de 2007

Fim de semana no sofá

Há várias relações que se podem estabelecer ao longo da vida.

Uma dessas relações pode ser com o nosso sofá.

É confortável. Podemos deitar-nos em cima dele e virar e revirar e voltar a virar. Quando chegamos recebe-nos de braços abertos. Quando vamos embora sem dizer nada ele não se queixa, porque confia e sabe que vamos voltar. E quando voltamos a deitar-nos com ele, o sofá sabe que nos tem só para ele pelo tempo que for necessário. Ele ganha as nossas formas. Nós acomodamo-nos a ele. Choramos. Caímos. E sentimo-nos como se fossemos abraçados. E mesmo quando saímos por mais tempo, ele conhece as nossas formas. E às vezes trazemos outras pessoas para ele sentir a vida que nos rodeia. Deixamos entrar alguém na nossa intimidade. Não é sempre, porque precisamos de tempo para sentir. Sentir o vazio de estar no sofá. Às vezes, o sofá fica velho. As nossas formas já não se acomodam às formas dele. Ele já não nos abraça com a mesma graciosidade e compramos outro ou mandamos arranjar o mesmo. E aí... Voltamos a re-construir toda a relação de confiança e conforto sem a qual não sabemos viver.

Acho que não sabemos viver sem o nosso sofá.



Acho que não sabemos viver sem a confiança no amor incondicional de alguém.
Alguém que está sempre à nossa espera quando regressamos seja lá de onde for.

Primeiro dia do ano

Primeiro dia do ano.

As frases batidas. As decisões de hoje que morrem amanhã. E vejo as tulipas caírem de um céu enevoado. Flores que explodem num todo de cores. Por momentos vejo um arco-íris. São tantas as cores que as estrelas podem ter. As estrelas num céu enevoado. Enevoado pelos meus olhos. Coberto de nuvens que teimam em esconder a lua. E ouvem-se as pessoas. Esperança nas promessas de um novo ano (que tal como me disse alguém: "os novos anos são como os políticos"). E repetem-se as frases batidas. Sempre as frases batidas já sem o sentido que aquelas palavras têm. E as decisões que vão morrendo conforme chega a manhã. E as pétalas das tulipas que caem. E as estrelas que nos iluminam para esperarmos pelo dia enquanto a escuridão nos envolve.

Primeiro dia do ano.

E a única coisa que me lembro é de que não posso esquecer que sou uma pessoa única, especial e linda! E o único desejo que tenho é de não me esquecer disso na hora de decidir nem nas horas que viver. E a única realidade que quero aceitar é o que de melhor for capaz de imaginar.

Primeiro dia do ano. 11680 dia da minha vida. Mais coisa menos coisa aqui estou eu, em cima de um monte capaz de avistar uma longa planície à minha volta cravada de tons avermelados ou alanrajados e sou apenas a Tulipa Vermelha. Aquela que sonha. Aquela que acredita no poder da fé.

 
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